A linguagem de um corpo, o corpo de uma linguagem: a poética do real inscrita na literatura contemporânea de Wesley Peres
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Universidade Federal de Catalão
Resumo
A presente tese tem como objeto de pesquisa dois livros de autoria do escritor goiano Wesley Peres: o romance As pequenas mortes (2013) e o livro de poemas O corpo de uma voz despedaçada (2019). O itinerário da pesquisa parte de uma convocação da literatura para discorrer sobre o próprio homem, sua relação consigo mesmo e com o outro, num eterno duelo de alteridades. Partindo-se da Odisseia, poema épico de Homero, busca-se uma ancoragem na contemporaneidade para situar as obras sob análise, pois é no torvelinho do agora que tanto a lírica, quanto a prosa de Wesley Peres surgem como frutos estranhos ou gêneros literários de ossatura híbrida, nos quais uma alta voltagem poética contamina a palavra, fabricando-a nova e outra, numa exaustiva tentativa de dar verbo à tragédia do Césio – 137, ocorrida em Goiânia, em 1987. Com lastro na noção de real, do psicanalista Jaques Lacan (1974-75; 2007; 2008a; 2008b), bem como nas ideias do pensador Giorgio Agamben (2006; 2009), a respeito da impossibilidade do testemunho daqueles que sobreviveram ao holocausto, a lírica de Wesley Peres revela-se um contundente território de reflexão a respeito do medo e da morte daqueles que foram espoliados de seu quinhão de humanidade e, por essa razão, privados de linguagem suficiente para contar sua própria história. Temos assim o real da letra, plasmado na impossibilidade do testemunho, restando aos poetas fundar uma nova e outra língua, cuja palavra é sintoma do corpo que escreve, sentido e significado daqueles que mortos, só podem falar, por intermédio daqueles que sobreviveram. A figura iconoclasta de Felipe Werle, narrador do romance As pequenas mortes, cujo título faz remissão ao constante estado de gozo do protagonista, é marcada por incontáveis obsessões em torno da figura do pai, do irmão, da música, da amante, da literatura, do césio e, sobretudo, de um câncer, ainda não detectado. Aqui o corpo emerge como repositório de múltiplos sintomas, tornando-o maldito, erótico, acústico, significante e, notadamente, mortífero, gozoso e doloroso. De criação livre, o quarto capítulo ousa um novo arranjo a partir de poemas minimalistas, urdidos a partir daqueles escritos por Wesley Peres, resultando numa lúdica antologia de seu particular léxico e alguns neologismos, que gravitam em torno de sua voz lírica fragmentada. Por fim, a hipótese fundamental da presente tese, é que o poeta mimetiza a linguagem de seu corpo, vivo, falante e pulsional, marcado pela impossibilidade do testemunho absoluto, em especial a respeito da morte e do sexo, cuja literatura produzida condensa o corpo de uma linguagem, imperfeita e lacunosa, ante a inexistência de um significante, primeiro e último, capaz de dizer tudo.